Mas por que estou no México? São férias? É turismo? É para visitar a família?
É para tudo isso, sim, y algunas cositas más. Depois de quase quinze anos compartilhando a vida com alguém quem tem suas raízes ao lado da das plantas de agave, um pedaço da minha história de vida também acontece no México. Mesmo que eu não esteja aqui. Há quase quatro anos não venho pra cá – o que, felizmente, não impediu as pessoas que mais estimo, minhas crias e o cúmplice dessa criação, de visitarem o país. Daí acontece que, quando chega a minha vez de vir, tanto tempo se somou para que o momento de driblar esse tempo fique mais especial.
Meus filhos são (também) mexicanos. Assim como meu estômago e algumas de minhas comidas favoritas adquiridas ao longo dessa aventura: dois meses antes da viagem eu não conseguia parar de pensar nos sopecitos do La Rinconada, em Lagos; na carne en su jugo e uma longa lista de delícias preparada pela minha sogra; nos esquites comidos nas ruas.
Porém, vir ao México dessa vez tem outros sabores especiais que não são gastronômicos. Essa viagem concilia vida pessoal, profissional, acadêmica. Conseguir sentir que você, como mulher, está bem em todos esses aspectos de uma vida escrita com distâncias e saudades, desconstruindo a fantasia de que se poderia estar melhor em “outro lugar”, já que sempre tem um “outro lugar” em que o migrante poderia estar, é de um prazer interno que não tem tamanho. Esse é o lugar mais importante em que cheguei e o que verdadeiramente celebro com essa viagem.
Digo que é de um prazer que não tem tamanho porque, há cerca de duas décadas, ando tentando achar esse louco equilíbrio, enfrentando meus dragões diários e matando alguns leões. Como tantas mulheres que desejam ter filhos (ou não), desejam ser profissionais bem-sucedidas, desejam estudar, desejam viajar, desejam ter estabilidade econômica, há muitos momentos em que parece que a equação não fecha. É coisa demais que o mundo insiste em achar que devemos fazer. E fazer BEM. É enlouquecedor achar que devemos tudo isso, cavando um buraco sem fundo de nossa dívida com nós mesmas.
Hoje os astros estão alinhados e eu estou em Oaxaca. Mas não foram os astros que me fizeram estar aqui: alinhei minha autoexigência também. Deu mais trabalho que uma renda de bilros. Levei alguns tombos, trabalhei muitas horas enquanto outros descansavam e ainda não me vejo completamente livre de trabalhar aos finais de semana. No entanto, dentro da exigência, encontrei meu ritmo, minha moderação. Planejar, organizar, sonhar. Tão importante quanto estabelecer metas é definir seus limites.
Então essa viagem é uma celebração disso tudo. E, sim: eu vim pra comer. Eu vim pra tirar fotos. Eu vim pra mergulhar no Pacífico. Eu vim pra passar muito tempo muito perto dos meus filhos e do meu companheiro. Eu vim rever minha grande família mexicana. Só vim porque pude trabalhar em remoto em meu emprego formal. E, para minha alegria, vim ainda dar algumas palestras e workshops sobre esse assunto que amo tanto, o plurilinguismo.
Começo a agenda no México com a atividade mais deliciosa e desafiadora de todas: eu vim para contar histórias plurilíngues para bebês. Superdiversidade, lá vamos nós: nada mais encantador e imprevisível que um público tão mirim.
E digo mais: se você ainda não contou histórias para um bebê, não está preparado para quase nada nessa vida.